segunda-feira, agosto 13, 2007

Nunca Mais Voltar

Eu decidi ir embora. Daqui, pra longe, pra qualquer lugar distante de mim mesmo. Distante das pessoas, dos olhos e das vozes. E não é que isso cansava? Eu não durmo porque eles continuam olhando. À noite, eles ainda vêm me buscar e eu não sei reagir, então eu não durmo. Eu deixei de dormir pra deixar de sofrer e sonhei de novo com saudades. Tudo o que eu faço, tudo o que eu tento tem gosto, cheiro, cor e jeito de saudades. Saudades do que eu não tenho e saudades do que eu não tenho mais. Uma mão, um abraço, um beijo. Um carinho rejeitado. É melhor fugir. Eu arrumei as malas. Amanhã eu acordo e vou embora daqui. Amanhã é o dia pra isso. Eu nunca mais vou voltar. De repente me ocorreu e eu soube que seria assim. Eu não vou voltar pra cá. Se eu voltar, o lugar vai estar destruído. Se o lugar continuar, eu morro na estrada. O vidro espatifado não vai deixar que me reconheçam. Pra sempre eu vou embora daqui. Meu corpo morto vai sobrar pra quem tiver uso. Eu vou embora daqui. Eu vou embora pra não ficar mais de lado. Eu cansei dos lados. Seu lado, lado dele, lado deles. Eu sempre fiquei pro lado. Eu escorreguei por todos, e fiquei de lado. Agora não tem mais jeito. Suas palavras duras e seu silêncio me ajudaram a dobrar e guardar. Tudo o que eu preciso está lá. Um cachecol branco e toda a minha solidão. Não é surpresa que a mala não feche. Debaixo do fundo falso eu guardei umas lembranças. Um anjo de papel, um passarinho velho, um bilhetinho, duas cartas e umas passagens de ônibus. Tudo o que eu tive de verdade e que pode ser meu pra sempre além da lembrança, além da imaginação do que eu queria. Eu quero. Mas é tarde. Já é noite e ao nascer do sol eu vou-me embora pra sempre. Eu preciso. Qual é a minha escolha? É hora de olhar pra frente e, se eu chorar, aceitar que eu vou chorar pelo caminho. Talvez sigam meus rastros, mas não seria pra me trazerem de volta. Eu não posso voltar. Eu cansei de voltar. Eu cansei de só ter respostas sonhando. Meu monólogo se estendeu por mais do que eu agüente. Por mais do que a platéia agüente, porque já foram todos embora. Eles me deixaram aqui. Eu fiquei. Você me deixou. Mas eu conheço essa história. Eu já nem sei pra quem eu escrevo, tamanho é meu abandono. Esse relato vai ficar esquecido. Esse desespero vai ficar calado pra vocês, mas será o grito que me acompanha durante o resto do caminho. Eu já posso ver. Eu, carregando uma mala imensa por uma estrada de terra e árvores secas. Até eu cair. Eu espero que os animais me devorem. Eu espero que, uma última vez, alguém me use. Meu corpo inerte vai esperar a ação do tempo. Meu corpo inerte vai esperar que você venha me gritar qualquer coisa que me faça sentido. Agora eu sei que é tarde. Meus olhos doem. Enxergar a verdade dói demais. Eu preciso dormir, mas a viagem de amanhã tem que estar preparada. Eu não consigo fechar a mala... solidão demais. Odeio a minha solidão. Sem ninguém pra me ajudar. Eu preciso fechar uma mala e viajar. Você não entende. Eu decidi ir embora amanhã. Amanhã eu vou embora pra nunca mais voltar...


... ninguém pra me dizer adeus.


Henrique Rochelle Meneghini

6 Comments:

Anonymous Anônimo said...

espero que TUDO seja ficção e mais nada, ok?
se acontecer alguma coisa anormal (mas não vai pq eu não quero que aconteça), a gente se fala sempre...

falando nisso, pq não me disse nada hoje? só pq o dia foi corrido com as excursões?

te amo até depois do sempre!
=*

13 agosto, 2007 23:20  
Blogger Hernán Rodríguez D. said...

"as horas" es un libro ?

maybe is mrs. dalloway

14 agosto, 2007 01:43  
Anonymous Anônimo said...

Seu post foi um bocado dramático. Sinto que apesar de um tchau, foi um prenuncio de socorro.
Gostei do texto, só espero que esteja bem.
" Meu monólogo se estendeu por mais do que eu agüentei. Por mais do que a platéia agüente, porque já foram todos embora."
Não perca o teu dom, ele é raro.
Guarde estas poesias e esses nobres sentimentos pra quem um dia os mereça. Ou pra quem um dia seja capaz de enchergá-los.
Talvez a questão seja essa.
Isso me lembrou Fernando Pessoa também
"O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente..."
Abraços \o melhoras

19 agosto, 2007 22:12  
Anonymous Anônimo said...

Bah, enxergar com X rs. ôÔ

19 agosto, 2007 22:15  
Anonymous Anônimo said...

:~~

20 agosto, 2007 09:12  
Anonymous Anônimo said...

Parece que eu vivi um pedaço disso ontem. o.o

Foi mais um dia com brigas e intervalos mínimos entre elas e (acredite!) por aquele motivo que ja conversei com vc, e vc me ajudou maaaaais de uma vez.

Eu saí à noite e me sentei no banco de uma pracinha que fica a uns 2 quarteirões daqui... fiquei lá algumas horas. Tava ventando, e tava gostoso. Eu neim quis ligar o mp3 que tava no meu bolso pq eu quis prestar atenção no barulho da cidade. E eu neim gosto daqui.

Vou ler esse texto d novo, antes d ler o próximo...

09 setembro, 2007 12:27  

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