sexta-feira, dezembro 25, 2009

Doce

(trilha sonora obrigatória: http://www.youtube.com/watch?v=zOpT8vsloeA)

Onde foi? Em alguma parte do caminho, nos tantos quilômetros de estrada, em algum acostamento, eu perdi meus pedaços preferidos de mim mesmo. Quando deu meia noite e todo mundo se abraçava, eu olhava de canto, tentando saber como foi que eu deixei de ser doce. Como foi que eu deixei cair de mim o que me fazia sorrir. Sorrisos enormes. Sorrisos gigantes que eu não sei quanto tempo faz que eu não dou. Eu passei da idade de pedir o que quiser de presente. Eu cheguei nos dias de entender porque não se pode ter tudo. Tudo o que eu nunca quis entender. Em todos esses dias, eu perdi o encanto. Perdi a graça e eu me olho no espelho como se analisasse, como se dissecasse o que antes me olhava de volta como se sentisse. Sem saber o que fazer de mim, eu fui arrastando as horas e agora já não sei como terminar uma noite. Como ir pra cama e fechar os olhos, com todo o peso de fugir de mim por todos os lados, empurrando meus travesseiros, minhas almofadas, empurrando meu sono e distraindo meus sonhos. Eu não sei mais ficar sozinho comigo, porque eu não gosto do que eu acabei sendo. Sem convite, sem companhia, eu completo as noites esperando que alguma coisa mude, mas os açucareiros de casa estão todos sempre cheios de formigas. Onde foram parar minhas abelhas? Minhas árvores? Minhas asas? Meus solstícios? É verão e eu não li isso no céu. Eu perdi meus olhos em algum lugar. Onde foram parar as histórias que me acordavam quando eu era feliz? Onde foi parar meu sono? Eu pedi. Eu juro que pedi. Escrevi e mandei carta. E em nenhuma caixa eu me encontrei. Eu desembrulhei tudo o que eu queria, menos eu mesmo. E não me achei debaixo da árvore. O que eu era é vidro de açúcar estilhaçado pela rodovia, no meio do caminho do que eu queria ter sido. E eu nunca mais soube me fazer companhia. Pela primeira vez, eu-mesmo era a primeira coisa na minha lista de presentes. E pra todo mundo que há anos me insiste que é disso que eu precisava, vontade de mim mesmo e não dos outros, eu tenho toda a amargura que juntei pra mostrar que eu estava certo. Não... eu preciso de chuva de estrelas cadentes. Eu preciso de açúcar. Mais. Mais sonhos. Mais abelhas. Mais doce pra eu-mesmo ser mais doce. Pra ser mais eu. Pra colocar o gorrinho e passar o próximo Natal com sorrisos imensos, cantando que de agora em diante, todos os problemas estarão a milhas de distância. Estilhaçados pelas rodovias do meu caminho, como vidro feito de açúcar.





Henrique RM